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  • Foto do escritorTania de Paula

Televisão: Relembre quem foi a primeira jornalista negra a apresentar um telejornal

Atualizado: 4 de fev.

Portal WTB News foi buscar Anna Davies na história da televisão.

Anna Davies apresentou "Jornal Hoje" na década de 70. Foto: Acervo Pessoal
Anna Davies apresentou "Jornal Hoje" na década de 70. Foto: Acervo Pessoal

As últimas semanas foram marcadas por um bombardeio de discussões nas redes sociais acerca da inserção de mulheres negras no mercado de trabalho. Para ser mais específico, outra discussão também tomou conta da internet: citemos o debate causado em torno da belíssima jornalista Maria Julia Coutinho e sua promoção, de repórter do tempo à âncora de um telejornal de alcance nacional. Sim, ele mesmo: o "Jornal Nacional".

BRAVAS MAJUS, GLÓRIAS, DULCINÉIAS E ZILEIDES!

Maju seria a primeira mulher negra a sentar em uma daquelas cadeiras, na bancada do noticiário mais importante da "TV Globo", para a felicidade de seus fãs. O Portal WTB News fez um levantamento e vale ressaltar que antes de Maju, outras mulheres negras também foram pioneiras no telejornalismo.


Muitas são conhecidas pelo público, como Glória Maria, Zileide Silva, Dulcinéia Novaes, entre outras. Glória Maria, por exemplo, de vez em quando aparece ao lado de Sérgio Chapelin no "Globo Repórter". Zileide Silva apresenta esporadicamente o "Jornal da Globo".


Antes mesmo da tevê a cores, e por variadas emissoras brasileiras, muitas outras mulheres, embora o fato de não terem a oportunidade de serem âncoras, brilharam como repórteres. Mas, afinal: quem teria sido a primeira mulher negra a assumir a bancada de um telejornal? Nossa equipe foi buscar a resposta na própria história da televisão brasileira.

ABRAM ALAS, DEIXEM A DAVIES SE (RE) APRESENTAR!

A "juventude atual" de profissionais e espectadores não recordará, mas uma grande pioneira do telejornalismo brasileiro e que foi, de fato, a primeira profissional negra a apresentar um telejornal de rede se chama Anna Davies. Ela atuou na "TV Globo" nos anos 70, quando a "caixinha mágica" ainda era em preto e branco.

Anna Davies (à esquerda) e colegas de trabalho. Foto: Acervo Pessoal
Anna Davies (à esquerda) e colegas de trabalho. Foto: Acervo Pessoal

Dona de uma voz inconfundível e arrepiante, foi repórter e apresentadora de telejornais, tais quais "O Povo na Tevê" (SBT, dirigida pelo saudoso Wilton Franco), "Telejornal Brasil" (SBT, ao lado de Bóris Casoy), e entre tantos. Uma das suas mais marcantes passagens foi, porém, pelo "Jornal Hoje" (TV Globo), também como âncora. Como repórter, também atuou em vários programas da emissora, entre eles, "Jornal Nacional", "Fantástico" e "Globo em Dois Minutos".

TVE, GLOBO, SBT, BAND

A experiência dessa moça não parou ali: atuou várias vezes como produtora em programas conhecidos daquela época, tais quais "Mobral - Paf TV - Programa de Alfabetização Funcional" (TVE Rio), "Programa do Chacrinha", "Hebe Camargo", "J. Silvestre", "Flávio Cavalcante" (quando ainda eram pela TV Bandeirantes), e ainda, pelos telejornais desta emissora.


Salve Anna Davies, mineira do bairro de Santa Efigênia, em Belo Horizonte! Jornalista profissional, apresentadora, repórter, redatora, radialista, editora e escritora. Iniciou carreira na "TV Globo Minas" em 1972. Bela notável, com seu trabalho competente, logo foi convidada para o Rio de Janeiro, quando assumira atividades como repórter, e em seguida, fora promovida à bancada de telejornais.

Anna Davies. Foto: Walter Firmo/Acervo Pessoal
Anna Davies. Foto: Walter Firmo/Acervo Pessoal
BUCÓLICA MARICÁ

Mãe de quatro filhos, uma moça e três rapazes, ela hoje aos 67 anos, escolheu Maricá (RJ) a cidade para morar e curtir amigos e família. Anna Davies bateu um agradável papo com o Portal WTB News e contou um pouco de sua trajetória e momentos tristes e felizes da profissão.

ENCONTRADA POR UMA 'CAÇA-TALENTOS'
Intelectualidade e competência foram notadas. Foto: Acervo Pessoal
Intelectualidade e competência foram notadas. Foto: Acervo Pessoal

"O que me destacou na época, para ser vista por uma caça-talentos da TV Globo (década de 70), foi a minha presença marcante na cena cultural mineira, em Belo Horizonte, onde eu estudava teatro, na Escola de Teatro Universitário - TU - da UFMG, publicava contos no Suplemento Literário do Jornal da Imprensa de Minas Gerais, desfilava como modelo para os estilistas da moda e frequentava os círculos descolados de Belo Horizonte. Além dos meus talentos e estudos, a minha imagem de jovem negra, bonita, vestida na moda e de cabelo black-power, chamou a atenção dos que buscavam uma jovem que pudesse replicar na TV Globo a imagem da ativista negra norte-americana, Angela Davis. Por isso me deram o nome de Anna Davis (nome de batismo: Maria das Graças Silva) contra a minha vontade".

O COMEÇO DE CARREIRA E A COMPETIÇÃO

"Iniciei minha carreira jornalística na TV Globo Minas, em 1972, apresentando o Jornal Hoje local. Em 1973, a Globo Rio convidou-me para um novo teste que me colocaria como um dos apresentadores do Jornal Hoje, em nível nacional, o que aconteceu, além de ser repórter da casa. Para entrar na Globo Minas fui submetida a testes de imagem, locução, etc. Concorri com outras candidatas, todas brancas, e ganhei. Entrei na Globo por mérito, sorte, e pela graça de Deus".

UMA JORNALISTA NEGRA EM UMA EMISSORA ABRANGENTE
De menina pobre à grande apresentadora de telejornal. Foto: Acervo Pessoal
De menina pobre à grande apresentadora de telejornal. Foto: Acervo Pessoal

"A minha experiência como jornalista na TV Globo foi boa e ruim ao mesmo tempo. Fui bastante apoiada pela direção da Globo, mas tive muitos problemas com colegas invejosos que não admitiam a minha presença entre eles. Ao mesmo tempo eu não conseguia me impor de forma soberana, porque me faltavam meios financeiros e estrutura familiar e emocional para enfrentar a concorrência furiosa entre colegas de classe média e alta, quando eu tinha vindo, inicialmente, de uma vida miserável na Favela dos Urubus, no Bairro de Santa Efigênia, em Belo Horizonte, onde tinha passado todo tipo de privação e humilhação, mas, graças a Deus, superado pelo trabalho, humildade, esforço próprio, ajuda de pessoas que viram em mim algum talento, muito estudo e muita leitura de literatura clássica".

UMA JORNALISTA NEGRA EM MEIO AO REGIME MILITAR

"Quanto à parte política, eu tinha conhecimento do regime militar, mas não tinha opinião sobre ele, não entendia de política em profundidade e procurava não me envolver, aconselhada pela minha mãe. A única coisa que me interessava de fato era trabalhar e ganhar o meu dinheiro honestamente para me manter e ajudar a minha família, muito pobre, que tinha ficado em Belo Horizonte".

SOBRE BRASILEIROS QUE SE AUTODECLARAM NEGROS

"Se declarar negro não quer dizer que se é negro de pele ou de cultura. Mas o que isso importa? O Brasil é uma nação mestiça, na qual vários povos se misturaram criando uma Nação Maravilhosa. O que nós negros devemos fazer, ressaltando que eu sou mestiça de negra com branco, é procurar o nosso lugar no mundo, disputando pau a pau o conhecimento, a verdade, a intelectualidade e a espiritualidade. Nós somos e temos uma democracia racial legal e verdadeira. A desculpa de que "não posso", por causa do preconceito, é paralisante e asfixiante. Ignorar ou não reconhecer esta verdade cria um nó górdio que nunca será desatado por pura teimosia de se não querer enxergar a verdade dos fatos".

"SOCIALISMO E COMUNISMO NÃO GARANTEM PIONEIRISMO NEGRO"
Não foi só beleza. Foi luta e muito suor. Foto: Acervo Pessoal
Não foi só beleza. Foi luta e muito suor. Foto: Acervo Pessoal

"O que o pensamento comunista revolucionário enfiou na cabeça dos negros dos movimentos negros e sociais é que o Brasil só terá uma democracia racial quando se instalar aqui o regime socialista/comunista como foi implantado na África do Sul, Angola e outros países africanos. E quanto a isso sabemos muito bem que a bandeira da igualdade só provoca desigualdade. O mérito é soberano e sempre se impõe, por ser incontestável. Enquanto ficamos discutindo igualdade racial, reparação e outras firulinhas, nos omitimos de avançar na participação dos assuntos que realmente interessam e fazem a diferença no 'concerto' da sociedade brasileira, como um todo, e na 'sinfonia' das nações".

"TEMOS QUE SAIR DO GUETO"

"Temos que sair do gueto! Não sejamos empecilhos de nós mesmos! "Onde existe a vontade há um caminho", dizia Ayn Rand. Não considero o jornalismo uma profissão elitista e fora do alcance de negros ou qualquer pessoa, de qualquer etnia ou origem social, desde que a pessoa se disponha e se prepare para a função. Não penso que ser negro no Brasil seja difícil. A vida é difícil para qualquer ser humano. Todos enfrentam desafios e precisam se aperfeiçoar. Este é o sentido da vida e é uma dádiva a superação das dificuldades".

UM RECADO À MAJU
Anna Davies. Foto: Acervo Pessoal
Anna Davies. Foto: Acervo Pessoal

"Com relação à estreia de Maria Júlia Coutinho, a Maju, na bancada do Jornal Nacional, é um ganho imenso para a auto-estima e vontade de desenvolvimento para quem quer melhorar de vida. Maju não será inspiração apenas para negros e sim para todos. Desejo a ela os meus melhores votos de sucesso nessa nova jornada. Ela está de parabéns e já é um modelo de sucesso, garra, inteligência, beleza e força de vontade".

"NOVAS GERAÇÕES NEM SABEM QUE EXISTI"

"Meus contemporâneos, como você (a repórter Tania), lembram-se, com certeza, do meu surgimento na TV Globo, por ter sido um diferencial muito marcante. Infelizmente as novas gerações nem sabem que existi ou existo. Fico gratificada quando você diz que fez jornalismo inspirada por mim. Parabéns pela criação de um portal de notícias! É fundamental que possamos expor livremente as particularidades dos nossos pontos de vista".

PLANOS PARA O FUTURO

"Uma boa novidade é que o escritor e professor universitário Carlos Nobre vai escrever minha biografia e está aceitando patrocínio. Estamos reunindo documentos e pesquisa para finalizar o projeto e, junto a um patrocínio, viabilizar o livro. Quanto a voltar ao mercado, só pretendo voltar aos meios de comunicação como editorialista ou comentarista e muito bem paga, pois fui repórter, apresentadora, âncora de telejornal, pauteira, chefe de reportagem, editora, assessora de imprensa, criadora de jornais e revistas. Titular comunicadora de programas tevê e rádio, etc. Não posso voltar na minha história, apenas ir em frente".


[A equipe do Portal WTB News acrescenta que Anna Davies também foi professora universitária em pelo menos três instituições, lecionando cursos importantes para a comunicação social, como locução, oratória, apresentação de telejornal, dublagem, entre outros. Toda sua bagagem profissional lhe dá, por direito, o título de catedrática no jornalismo, sobretudo por sua importante passagem por tevês e rádios.]

EM ÁUDIO, ANNA DAVIES DEIXOU UM INCENTIVO ÀS NOVAS PROFISSIONAIS. OUÇA:

*Edição de texto e coparticipação nas apurações: Rodrigo Trindade.


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Anna Davies, atualmente. Foto: Acervo Pessoal
Anna Davies, atualmente. Foto: Acervo Pessoal


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